Entrevista com Ariel dos Restos de Nada e Inocentes
R.: Já ouvíamos um rock’n’roll mais estranho, então quando surgiu o
punk rock, por volta de 76 e 77 por aqui, aderimos imediatamente.
Frequentávamos uma galeria no centro de São Paulo onde tinha uma loja de discos
e já começava a vir alguma coisa de new wave e punk rock no meio de umas
importações de discos de vinil. Pela capa de discos e por alguma matéria em
umas revistas de rock e comportamento jovem também, como a Revista Pop.
2-Quando você decidiu que sua carreira iria ser ligada à música?
R.: Desde sempre...rs Desde muito jovem ouço muita música, de vários
estilos e optei pelo punk rock como expressão musical a partir dos 14 anos,
onde até já tinha comprado um microfone, sem mesmo ter uma banda, mas já estava predestinado e a
partir de 1977, já me aproximei de pessoas que tocavam algum instrumento e
nunca mais parei.
3-Como conheceu o Clemente e os outros integrantes e como aconteceu
a sua entrada nos Inocentes e posteriormente nos Restos de Nada?
R.: Conheci o Clemente, o Douglas e alguns punks no EETAL, uma
escola situada no Bairro do Limão, vizinho à Freguesia do Ó, onde eu residia.
Nessa escola formou-se uma cena musical independente com várias bandas de rock
e ali também vimos surgir as primeiras bandas punks do Brasil, a Restos de Nada
que puxou o Condutores de Cadáver e Cólera, mais a AI-5 que era do centro da
cidade de São Paulo.
Entrei na Restos de Nada em 1978, antes eles tinham um vocalista que
durou apenas uma apresentação no EETAL. Como eu estava sempre próximo ao
Clemente e ao Douglas e de tanto mostrar meus escritos para eles, acabei
entrando na banda. Quando o Mauricinho, o primeiro vocalista da Inocentes saiu,
ficou um vácuo. A Restos de Nada tinha acabado e eu e o Douglas tínhamos
formado a banda Desequilíbrio em 1981 e em 1982 me chamaram pra ser o vocalista
da Inocentes.
4- Como era gravar um disco naquela época, havia bons estúdios, como
vocês decolavam a grana para as gravações?
R.: Era muito difícil gravar um disco, pois além da grana, tínhamos
que submeter as músicas à censura e se eles não aprovassem, as fábricas não
prensavam. Não havia estúdios para gravações de Rock’n’Roll no Brasil e muito
menos produtores e técnicos. Tudo era muito padronizado em termos de gravação e
quando entramos com pedais de distorção, eles achavam que tudo estava com
defeito...rs A grana era arrecadada entre os integrantes e parentes.
5- Quais as suas bandas preferidas do punk rock brasileiro de todos
os tempos?
R.: Já fiz parte de várias bandas e colaborei com uma boa parcela
delas e fica difícil escolher. Prefiro pular essa. rs
6- Conta aí como era o ambiente vivido nos anos 80, havia muita
camaradagem, muita rivalidade e ganguismo, muita pancadaria, ou o espiríto era
mais de união?
R.: São Paulo é muito grande e cada bairro tem suas próprias regras
e códigos e daí surgiram várias gangues que a princípio tinham muita rivalidade
entre si, disputando os pontos de encontro e os lugares onde se tocava o punk
rock. Não havia muita camaradagem não...A partir de meados dos 80, a coisa
ficou mais unida em torno do punk e a rivalidade que se iniciou foi contra o
fascismo dos grupos de skinheads que pregavam o ódio e a intolerância.
7-Como você vê o punk rock nos dias actuais, acha que se tornou um
produto da globalização, ou acha que continua mantendo o espirito diy?
R.: Acho muito confuso nos dias de hoje. O mundo mudou muito e a
informação é tanta que não se precisa mais buscar o conhecimento, ele já vem
embalado por conceitos, os mais diversos, e poucos estão dando continuidade ao
princípio original que gerou toda essa movimentação que já conta com quase 40
anos. Princípios realmente libertários se perderam, a essência do som também
está muito difusa, onde se acaba perdendo a identidade. Mas ainda sobram alguns
autênticos pra continuar tocando o barco.
8- Porque você saiu dos Inocentes e o Clemente assumiu os vocais,
foi por divergências musicais?
R.: Por divergências ideológicas e por tudo o que citei acima. A
banda Inocentes queria se tornar uma banda sem ideologia e mais preocupada em
agradar o mainstream, mudando o som, a postura e a essência do faça você mesmo,
que nos deu uma base sólida no punk, mas que se perdeu quando aceitaram uma
gravadora. Então eu era muito radical em meus princípios e me tiraram da banda.
9-Quando e porquê você decidiu fundar os Restos de Nada?
R.: A Restos de Nada surgiu em 1978, fundada pelo Douglas e pelo
Clemente. Eu entrei um pouco depois...
10- Ficou algum material por gravar dos Inocentes ou dos Restos de
Nada?
R.: Sempre fica alguma coisa, algum ensaio perdido em alguma fita
cassete...
11-Você tem algumas gravações inéditas das bandas por onde passou?
R.: Tenho sim...Inclusive da banda Desequilíbrio, de 1981,
intermediária entre a Restos de Nada e a Inocentes.
12-Gostaria de ver esse material editado nos dias de hoje ou acha
que não faz mais sentido?
R.: Estou digitalizando tudo, pois ainda está em fita cassete e VHS,
depois vamos pensar em editá-los.
13- Você manteve ou mantém contacto com punks de Portugal?
R.: Quase não temos contato com punks de outros países. Por incrível
que pareça, tinha mais contato quando era por carta, via correio...rs
14-O que você conhece do punk rock português?
R.: Pra ser sincero, não conheço quase nada. De nome o Mata Ratos.
Você poderia me ajudar...rs ( nota de editor, soua pessoa certa para ajudar) rs
16- Já terminaram as filmagens do documentário sobre você?
R.: As filmagens vão se estender por todo o ano e a partir do
primeiro trimestre do ano que vem, finalizado. Esperamos lançá-lo em Março ou
Abril.
18- Como correu a sua exposição de fanzines , vai decorrer noutros
locais?
R.: A exposição foi bem recebida por todos e contou com 300 imagens
de zines, fotos e flyers, basicamente dos anos 80 e 90. Estamos espalhando ela
por aí, em pequenas doses.
20-Palavras finais... fala o que lhe apetecer, promove seus
projectos e faz aí toda a propaganda que quiser.
A banda Invasores de Cérebros vai dar um tempo e como sou muito
envolvido com a cultura punk, tenho muita coisa a fazer, como discotecagens de
Punk Rock, exposições de material gráfico e fotográfico, leitura de poesias
rebeldes, produções de eventos e tudo mais...Sempre pelas ruas e fazendo eu
mesmo!!! ÊRA!
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